O céu não nos responde. O céu não tem nada a ver com isto. Os responsáveis pelo inferno que esta terra é para os animais estão entre nós. Mas o que faremos com a raiva? E o desespero? Temos de gritá-los ou vão matar-nos por dentro. Entendam isto como um grito.
Quando as dívidas a hospitais e clínicas veterinárias nos trazem a todos aflitos na União Zoófila, porque bem sabemos que, se não pagarmos, as portas se fecharão aos animais ao nosso cuidado, eis que nos surge ao caminho uma cadela atropelada, com as quatro patas fracturadas e uma ruptura no baço. Ei-la.
Diante de tamanho sofrimento e, em situação de descalabro financeiro, o que pode uma associação como a União Zoófila fazer? Ponderar a eutanásia. Não temos medo das palavras e não temos medo desta. Eutanásia é fazer parar o sofrimento quando não há esperança.
Mas ninguém mais do que nós sabe que as fracturas podem curar-se. Já tratámos de muitas dezenas de animais com fracturas, tantos deles entretanto adoptados e agora felizes.
Há uma voz que repete que as fracturas podem curar-se.
Mas outra voz lembra que serão pelo menos quatro cirurgias, seguidas de um longo período de internamento, para que esta cadela reaprenda a andar e de quanto dinheiro exactamente é que estaremos a falar?
Há duas vozes, cada uma expondo os seus argumentos.
E há o olhar da cadela, jovem e imobilizada.
Não, a Power Beat, foi assim que a chamámos, não será abatida (eutanásia é outra coisa).
Não decidiremos da vida e da morte dos animais que nos entram na alma dentro com base em critérios financeiros.
Mas, e então, o que faremos? O que faremos? De que maneira financiaremos quatro cirurgias ortopédicas?
Nós somos a União Zoófila. Vocês conhecem-nos.
Nós não temos nada a perder porque não temos nada a não ser o nosso trabalho.
Nós não temos vergonha de pedir. Nenhuma vergonha. Nós não mataremos animais que precisam de ajuda. Eutanásia é outra coisa. Nós estamos entre a raiva e o desespero.
Ouçam o nosso grito.
Não tapem os ouvidos ao nosso pedido de ajuda.
Não fechem os olhos ao olhar da Power Beat.
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